No primeiro dia do ano

Lá vai o Apóstolo dos Gentios, agarrado a um destroço do navio, nadando em direção a terra:

- Por que te esforças assim, Paulo?

Abandonado, perplexo, dia após dia, morrendo, por que não te deixas levar pelo mar, apóstolo das gentes?

Não vês que até o navio que te transportava se despedaçou e mergulhou no abismo? Hás que lutar sempre, inimigos por fora, conflitos por dentro, como um desesperado de Deus, um apaixonado pelo Eterno, um seduzido da Luz, que te cegou um dia, numa estranha declaração de amor, que deixaria marcas para toda a vida?

Por que não te deixas afundar no sepulcro profundo do mar, onde nenhum som da terra irá perturbar teu descanso?

Não podes parar para responder-me? Seguir-te-ei, então, até Roma, se preciso for.

Preciso aprender sobre o amor. Este amor que te obriga a manter viva a chama até que tenhas acabado a carreira e guardado, como um tesouro, a fé. Dá-me uma razão, uma explicação, numa linguagem que os gentios de hoje possam entender, aprender e levar adiante este estandarte que tua alma transporta em triunfo, enquanto o corpo lá vai agarrado a um pedaço de madeira, tudo que restou do navio que te transportava...

Bem poderias ter evitado tudo isso, se tivesses apelado para César. Não é verdade, meu irmão? Mas sei que responderás que assim agiste porque não importava. Não é assim? Quanto a mim, tendo apelado para César ou não, sinto-me presa ao que restou do navio que me transportava na direção de um ideal não alcançado ainda, quando vejo que mais um ano acaba de chegar ao fim...

Mas consolada pela certeza de que "todas as coisas concorrem juntamente para o bem dos que amam a Deus'; neste primeiro dia do ano proponho-me a esquecer todas as coisas que para trás ficam e prosseguir para o alvo, pelo prêmio da vocação celestial, ainda que presa a um navio que se despedaça. Como quem morre, mas mais viva que nunca; como entristecida, mas sempre alegre; como pobre, mas enriquecendo a muitos; como nada tendo, mas possuindo tudo; não sabendo o que me espera, a não ser que "Deus, em Cristo, sempre nos conduz em triunfo!". Não foi isso que te sustentou? A mim também. Louvado seja o Senhor!

Myrtes Mathias
Extraído da Revista Desafio Missionária 1T15 – UFMBB

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